segunda-feira, 30 de junho de 2008

Uma música, um sonho, uma história de amor






Texto da Do Carmo

UMA MÚSICA ... ... UM SONHO ...
UMA HISTÓRIA DE AMOR



Foi uma verdadeira HISTÓRIA DE AMOR. Sonhos podem ser materializados e romanticamente vividos, tudo depende da intensidade com que se sonha.

Não foi diferente com aquela mocinha sonhadora que no mês de julho do longínquo, mas tão presente ano de 1955, inicia seu SONHO DE AMOR. Quem é ela? Que sonho de amor acalentava?

Bem, passemos á história real dessa garota de dezesseis anos, que estava passando as férias de meio de ano na casa de família amiga dos pais, no Rio de Janeiro.

A garota sonhadora e romântica, que continua igual aos setenta anos, é a Docarmo, conhecem? Pois é, foi comigo que tudo aconteceu. Um sonho que perdurou até l972, quando foi irremediavelmente interrompido pela morte.

Era l955, minha irmã e eu, resolvemos passar as férias de julho, pela segunda vez, no Rio, aqui sofríamos uma acirrada vigilância de mamãe, e lá, embora dona Filó fosse uma " generala "; contávamos com seu Athaliba, que defendia a filha, Dina e nós também, das rabugices de dona Filó.

A casa ficava na Gávea, dentro do Jóquei Clube, onde seu Athaliba trabalhava como Administrador.

Como eram movimentados nossos dias ! Flertávamos com rapazes que trabalhavam no Jóquei ou que iam treinar equitação. Pelas manhãs, praia, as tardes deliciosos passeios à cidade, mais flertes, confeitarias, flertes, depois das 18 horas, só casa e nada mais .

Em uma sexta feira notamos um alvoroço incomum. Havia chegado uma turma de dez estudantes de Veterinária da USP., em visita ao Jóquei. Ofereceram um almoço no sábado e ( para nossa alegria ), seu Athaliba e família estavam incluídos no rol dos convidados.

Dia esplendoroso, festa maravilhosa, eu como sempre...sonhei. À tardinha apresentou-se um conjunto musical e todos acompanhavam cantando e dançando. Em um determinado momento o solista do conjunto ofereceu atender pedidos. Sou tímida, atualmente supero, não ousei falar que gostaria de ouvir alguma música do cantor Dick Farney, meu ídolo. Não lembro bem como foi, mas devo ter falado alguma coisa que identificou meu desejo, mas baixinho e naturalmente não foi ouvido. Flertei e dancei a tarde toda, não me interessando porninguém, era tudo festa, glamur e alegria. A festa encerrou-se às vinte horas e tudo voltou ao normal
Depois de tanta agitação, só nos restou uns comentários e onze horas, todos na cama.
Dormíamos. Silêncio absoluto. Eis que de repente, uns violões e uma voz bem desafinada, diga-se de passagem, despertam toda a casa e a vizinhança.

Cinco rapazes tocavam e um cantava as músicas de Dick Farney - Um cantinho e você, Não tem solução, Uma loura e Sábado em Copacabana - a minha música, a que devo ter balbuciado. Corremos para a janela.

Meu coração estava para sair pela boca, uma voz destacou-se::

- Menina, qual o seu nome, eu posso amanhã conversar com você?
Dona Filó adiantando-se e respondeu :

`- Não. Amanhã é segunda feira, agora já é domingo e nós queremos dormir. A menina é menina e não está em idade de namoricos, vão embora.

- Senhora, estou apaixonado pela sua caçulinha, deixe que eu ...........

Seu Athaliba intervém para terminar com aquele constrangimento permitindo que pela manhã, às onze horas voltasse. Ele agradece e diz :meu nome é Antônio, com acento, todos se retiram e ele vai cantando -
Mas vou voltar, lá pra semaanaaa........

Cinco anos depois, diante de um altar transbordando de luzes e flores, dizíamos SIM e tornávamos marido e mulher. Esse sonho foi vivido até que a morte nos separou, depois de dezessete anos de feliz e apaixonada convivência. Hoje tenho duas testemunhas vivas desse romance, as quais se multiplicaram dando-me três maravilhosos netos que amo incondicional e intensamente. Sou feliz e bem resolvida em meus anseios e objetivos e sinto-me muito orgulhosa com as realizações vitoriosas de meus filhos.

Recordar é viver, diz o refrão popular, então eu acabo de
VIVER AS EMOÇÓES DA HISTÓRIA DE AMOR DE MINHA VIDA.

Pai, chefe ou Rei (texto refeito)




Texto da Do Carmo
PAI ? CHEFE DE FAMÍLIA OU UM REI ?
(REFEITO)


Segundo o depoimento da filha caçula, que passo a narrar, fica para vocês, leitores, o julgamento final.

Nascida em uma família de classe média no final dos anos trinta, foi criada e educada tal qual uma boneca de porcelana, uma vez que seu nascimento deu-se dezoito anos depois do casamento dos pais.

Tudo que uma garota rica da época tinha, esse homem lhe dava - tanto materiais como culturais.

Por amor à família, estudou, cresceu como profissional, construiu um mundinho de conforto e amor para a mãe, que sempre colaborou costurando, e para as duas filhas.

Conta-nos ela com emoção, qual era a tônica predominante de seu comportamento : O bom humor.

Dentre as inúmeras histórias que contou, vou rapidamente transcrever duas :

Muito glutão e apaixonado pela cozinha, uma de suas distrações caseira predileta era fazer. Doce, sendo o principal - Compota de abóbora - que era preparado com todo o requinte de higiene e cuidados. Casca bem lavada, retirada sem " machucar a carne " , cubinhos todos milimitrados , secos com uma toalha de cozinha própria, açúcar bem peneirado e.......vamos para a panela e para o fogão. Todo ritual obedecido, era só esperar o término do cozimento, que transformava os cubinhos em uma pasta bem cremosa e doçosa, como dizia, mas aí é que estava o problema; quando esse ponto chegava, a panela já estava vazia, pois a cada minuto, lá estava ele de colher e pratinho na mão, pegando umas colheradas para ver o ponto. Iniciava o cozimento com mais ou menos três quilos, e depois ao retirá-lo, havia evaporado uns dois quilos e meio. Nunca ele conseguiu explicar esse fenômeno de evaporação.

Gostava muito de tocar bandolim e cantar "cançonetas da velha terrinha ". Quando chegava do trabalho fazia companhia à esposa, conversando ou tocando e cantando, sentado ao lado de sua máquina de costura, e se ela fosse preparar o jantar, lá ia ele acomodar-se na cozinha bem perto dela.; enquanto aguardavam a chegada da filha mais velha, que estudava, ele preparava a mesa para os quatro jantarem.

Sempre teve um comportamento muito alegre, disposto para `qualquer trabalho, calmo no falar e diante de problemas, mas muito responsável com os compromissos e preocupado com o que deixar de material para a família quando se fosse; como era muito rígido e intransigente com a educação e formação cultural das filhas, não se descuidou do acompanhamento aos estudos que ambas fizeram ate o curso superior, coisa rara na época, principalmente em classe média. Orgulhava-se de sua família.

Infelizmente deixou esta vida cedo, aos 67 anos, tranqüilamente, durante o sono depois do almoço, já estava aposentado há alguns anos, brincou bastante com seus três netos. Viveu e morreu com dignidade. Foi feliz.

Sua filha ao terminar o relato, questionou-me ; -

- A que conclusão você chegou ?

Paródia da Canção do Exílio - Meu Brasil

Texto da Do Carmo
MEU BRASIL

(PARÓDIA DO POEMA CANÇÃO DO EXÍLIO)



MINHA TERRA AINDA TEM PALMEIRA?
E O DESMATAMENTO, PRA ONDE IRÁ?
NÃO CANTA MAIS O SABIÁ,
ASSUSTADO QUE ESTÁ
DA SERRA A ASSOBIAR.

E O CÉU, OLHA SÓ
SEM ESTRELAS E SEM LUAR
POLUIÇÃO ENCOBRE TUDO,
ONDE CANTA O SABIÁ ?

NOSSOS RIOS NÃO TEM MAIS PEIXES
SÓ TEM TUDO QUE NÃO PRETA
EMBOLORA A DOCE ÁGUA,
SUA FALTA VEM DEPRESSA.

MAS MESMO ASSIM, MALTRATADA
É LINDA E HOSPITALEIRA ................
UM GIGANTE VARONIL
ESTE, É O MEU BRASIL.





EXERCÍCIO EM AULA


MINHA RUA TEM UNS CHEIROS
QUE ME FAZEM VIAJAR
A UM PASSADO TÃO QUERIDO
MAS QUE TRISTEZA, NÃO ESTOU LÁ.

Adivinhe quem sou (texto reformulado)

Texto de Do Carmo

SOU FAMOSO e CHARMOSO.
(TEXTO REFEITO)


Sou uma pessoa famosa de TV e Teatro, orgulho-me muito da minha profissão. Amo o trabalho que faço, não só por poder diversifica-lo no desempenho que oferece, mas também pelo ambiente em que fico. Gosto de gente me olhando. enquanto trabalho.
Já viajei por todo o mundo, A Suíça foi meu 1º banco escolar, adoro poder falar em diversos idiomas, bem como esnobar-me tocando vários instrumentos.
Meu tipo físico? Bem, como direi: sou charmoso, alegre, inteligente, já tenho os cabelos grisalhos, não sou atlético, mas sei dar minhas gingada. Já fui casado por duas vezes, tenho um filho com algumas limitações. Gosto da noite, e tenho por norma deitar-me ao amanhecer. Agora com o que vou dizer, certamente irão descobrir que sou. Gosto de comer feijão bem macio e com o caldo grosso, mas deve estar bastante frio ou melhor, bem gelado e regado com bastante azeite de preferência italiano. Ah!, e por falar na Itália, outro lugar que amo, sou apaixonado por um suculento " macarrone " da mama, regado com um estupendo " Chianti ". Não consigo ficar um dia sem ouvir meus blues ou jazz, sou ligadão na música e na cultura britânica. Ah!!!, já emprestei meu nome à diversos programas.
Não sou mais secredo para vocês, não é?

Micro conto Maldito mico- falante





Texto de Gabriela Araujo





Costumeiramente aproveitava domingo para pechinchar o preço dos mais diversos e variados itens de sua coleção de objetos descomunais, todos comprados na feira organizada por uma comunidade de ciganos. Aquele único momento que deixava o minúsculo apartamento era perfeito para eu usufruir de um universo tão diferente posto em peças que exalavam aroma antigo e oriental.


Eram esculturas que personificavam credos ciganos, xales, roupas, talismãs, leques, retratos de animais por mim nunca vistos, chapéus, moedas e livros capaz de proporcionar a imersão em um mundo particular e único onde minha imaginação flutuava livre por direções opostas às decisões racionais e petrificadas. Tinha obsessão pelo canto incabível em meu cotidiano cético, exato e linear.


Faltava magia em minha história e o tempo que passava naquela casa trazia-me gratificante sensação de invasão de uma privacidade incrível e misteriosa que nada se parecia com a minha, metódica e monótona, e me proporcionava horas de um alívio absoluto.


Apropriava-me dos objetos e contava para os fiéis e fascinados ouvintes, a mais atenta era a velha poltrona, histórias interessantes da minha vida como conhecedora dos mais diferentes cantos do mundo.


Mas, deveria saber que aquele mico- falante me causaria problema. Ouvira certa vez que o animal empalhado falava, porém nunca havia escutado sua voz. Também, como poderia um animal morto falar? Às vezes o cobria com um pano, pois, justamente no clímax de meus enredos inventados, seus olhos secos e penetrantes julgavam-me.


Certo domingo, ansiosa, forcei a janela quebrada e me deparei com uma grade de ferro que impediu minha passagem para o encanto. Enfim minha invasão fora descoberta e fechou-se a única abertura para a magia em minha vida. Maldito mico -falante!

Mini conto



Texto de Ana Maria

Apertei o jacaré na bochecha, fiz bilú -bilú e ele me sorriu. Foi assim que comecei a terapia.

Ouvi quando a televisão perguntou algo a meu namorado



Texto de Ana Maria

Ouvi quando a televisão perguntou algo a meu namorado. Num relance a voz sonora e definida do locutor chamou-o pelo nome e lhe fez uma pergunta sobre a programação dos outros canais. Pasmei. Com a revista Ti Ti TI na mão, meu namorado respondeu de chofre e foi enumerando toda a programação para o locutor invisível. De beiço caído permaneci imóvel enquanto o imbecil continuava a longa lista de programação dos mais de vinte canais. Vez ou outra ele ainda me olhava como se a idiota fosse eu, como se fosse normal a televisão falar com alguém...Burro, se pelo menos ela estivesse ligada na tomada...

domingo, 29 de junho de 2008

Micro conto de Simone




Nunca vi uma salada reclamar tanto da vida. Insonsa, mas sempre escolhida, enquanto eu, gostosona e suculenta, mas virgem e preterida!

Reivindicação! Temos o direito?



Texto de Simone

Nunca vi uma salada reclamar tanto da vida. A única resposta que consegui dar ao alface, rebelde como uma noviça sem religiosidade, e aos seus companheiros fiéis de luta foi.
- E quem disse que a vida é justa?

Enquanto me encaravam como presidente de sindicato em busca de seus direitos, reclamavam como se estivessem sendo oferecidos ao sacrifício sem nenhum direito à defesa, ao invés de serem, reconhecidos com toda pompa que acreditam lhe ser dignos.

Essa é boa, quantas vêzes eu também passei por essa situação: de bode expiatório a famoso laranjão. Resolvo pepinos e descasco abacaxis e na hora de colher os frutos, tenho meus direitos e qualidades cassados.

Reclamavam do banho gelado e temperado ao sabor histérico do vinagre. Mas eu também levo muita água fria na cara e tenho que engolir. Ouço muitas abobrinhas e tenho que me manter ereto e flexível feito um pé de espiga.

Reclamavam para serem tratados com leves afagos manuais ao invés de cortes afiados. Essa já é demais... Da próxima vez vou dizer ao meu digníssimo chefe, enquanto ele me tosta, se ele pode usar uma língua menos cortante e ferina ao me espinafrar na frente de seus súditos fiéis.

Reclamavam pelo direito de escolher seus lugares, em cima ou embaixo, ao lado ou no meio do salão oval prateado. Vai que escapassem antes de serem devorados pela gana de seus algozes.

Imagina se um dia poderei escolher onde sentar enquanto meu diretor me oferece, de bandeja e amordaçado com uma maça na boca, aos seus esfomeados e incompetentes superiores e convidados, na procura de eu ser esquecido.

É isso aí....podem parar de reclamar! Hoje passei com louvor pela MBA de como se manter frio e anestesiado como gelo. Depois de dias em banho Maria, finalmente fui servido na Santa Ceia. Presidente, CEO, CFO, Diretores disso e daquilo me fritaram bonitinho: fui picado, esmagado, assado, tostado e devorado a seco, sem direito a uma cobertura de defesa. Estou farto de tanto pepino. Está na hora de variar... quem sabe encontro outro banana e meto a cenoura, mandioca e alface em seu devido lugar!
E se vocês reclamarem mais um pouco, vou comê-los, sem glamour, como porco. Afinal, que pena, se quisesse moleza, fosse um pudim!

Transfiguração




Texto de Loracy Santana

TRANSFIGURAÇÃO

Irritado o guarda-chuva se fechou e calou fundo. Temperamento aberto; escancarado; pára quedas; guarda-chuva aberto e arreganhado agora fechado, ferido e aturdido pela grosseria; ingratidão descabida. Uma palavra calou fundo, apenas uma teve a força maior que as frases ouvidas a vida inteira como brincadeira e debique, agora o limite calou as gargalhadas espontâneas, os abraços efusivos, o calor do afeto verdadeiro, sem falsidade. Chega!

Desde menino, mal balbuciava as primeiras palavras se misturavam com sorrisos, o olhar por si falava, quando abraçava alguém era carinhoso de afeto caloroso. Foi assim a vida inteira até fazer-se adulto de temperamento leve e brincalhão, por mais que dele falassem por galhofa, palhaço nas festas dos amigos, piadista e mágico nas horas vagas, a todos alegrava, onde estava ninguém podia ficar triste, a alegria nascera com ele e assim se sentia bem, apelidos vários, não se importava.

O momento, para ele sagrado, filha única lhe merecia respeito, deveria ser poupada, alma que transcendia ao etéreo e eterno inatingível aos simples mortais. Momento supremo de pureza absoluta, nenhuma palavra impoluta deveria voar e macular aquele instante. Bastou uma, dita como brincadeira de escárnio, interpretada como grosseira, proferida e indevida, inconveniência descontida. Transfigurado o caráter do homem solto e desenvolto em seu jeito de ser.

A partir daquele dia malfadado, ele magoado não mais sorriu, o semblante escancarado fechou-se para sempre. A sisudez toldou o seu íntimo, antes alegre e galhofeiro, o repertório de piadas trancadas para sempre em um cofre escuro, chaves atiradas no fundo do abismo, irrecuperáveis. Fechou-se, calou fundo a maldita palavra dita em tão má hora . O espinho rombudo que feriu seu coração de pai extremado, fincado no peito como eterna chaga, não demonstra mágoa nem arrependimento, o silêncio é a voz altiva que fala por todas e em todas as horas.

Sem alarde nem reclamação, via aos poucos os amigos se afastarem e sozinho encarava a mudança necessária, para continuar a viver sem nunca cometer nenhum desatino, não pretendia correr o risco de voltar a ser o que sempre fora, e em tempos ainda por vir se arrepender de ter saído do marasmo e porventura se perder em um mundo obscuro, onde sentisse que não lhe caberia, dali por diante. Distante, com a alma corroída, a alegria perdida não haveria nem teria motivação para ressuscitar o ser que dentro dele para sempre jazia morto e sepultado.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Dyonelio Machado

Um cidadão, que havia ido a um sebo comprar um livro antigo, certa vez me perguntou: "Mas por que os seus livros estão sendo procurados?". Eu respondi: "Foi porque eu morri". Então ele me dissë: "Ah, deixe disso!". Eu retomei. "Foi morte sim, porque somente depois de morto o escritor foi reconhecido."Há várias mortes, e me pegaram para uma delas".

Depoimento de Dyonelio Machado a Fernando Paixão e Nelson dos reis, em 1981.

A cigarra e a Formiga (texto revisado)





Texto de Loraci Santana
A CIGARRA E A FORMIGA – (Uma paródia em tempos modernos)

A cigarra com garra e afinco, dedicava ao seu solitário canto. Ensaiava e sonhava com um futuro brilhante. Verão, a época lhe inspirava melodias, na poesia e em toda arte. O sol no campo brilhava, enquanto ela cantava e enchia de harmonia todo o matagal, os insetos felizes aplaudiam a generosa música, cheia de graça e de graça cantada. A cada dia que passava, ela mais bonita se tornava, com a longa saia transparente, os olhos grandes e buliçosos contemplavam toda a beleza da paisagem. Estudava o canto lírico e se inspirava no popular para todos agradar.

Rasteira e matreira a formiga trabalhava, acumulava fartura para época do inverno, já previa a cigarra pedindo-lhe ajuda, não ajudaria, teria o prazer em humilhá-la e ensinar-lhe que a boa vida que levava, poderia ser breve, se acabava. Orientada por uma grande tanajura, estudiosa dos grandes clássicos da economia mundial do século XIX, a chefe comandava um grande exército de trabalhadores, estabelecia turnos de doze horas, a ordem era trabalhar, produzir e acumular.

A cigarra com o passar dos dias arrumou companhia, já não era solitária. Formou-se uma banda regida pela sua batuta, astuta a artista não dava na vista o seu talento para a arte, passou a ser contratada para apresentações em outras freguesias, sempre ao entardecer, pois a noite foi feita para o descanso. Não ganhava nenhuma fortuna, também nunca teve esse tipo de ambição, a sobrevivência e o aperfeiçoamento era suficiente para a realização dela e do grupo que a acompanhava, alegrava festas e casamentos, a fama corria solta, porém dinheiro nunca via, cantava pela alegria dos outros alegrar. A formiga no comando não aceitava desmando e esmerava na produção e as leis do capitalismo eram seguidas à risca, a grande mentora leitora de Maquiavel, sabia como comandar.

Vésperas do inverno, seria o inferno para os insetos cantores e trabalhadores; em suas apresentações a cigarra e o seu bando sempre alguma coisa ganhavam, precisavam sobreviver, que fosse ninharia, ela agradecia e mais alto e forte cantavam. A formiga irritada comandava o operariado, até que alguém entre elas alardeou: a vida não era feita só de trabalho, precisavam de lazer e diversão, fizeram uma reunião, a força do coletivo venceu, um sindicato foi criado para defender os interesses da classe trabalhadora; os turnos foram diminuídos e logo estabelecidos momentos para o lazer.

A cigarra e sua banda voltavam de uma excursão a um país vizinho, estava chegando o fim do verão. Deram um grande concerto, a cigarra chefe surpresa percebeu a enorme multidão que aglomerava em sua festa de boas vindas, o formigueiro inteiro dançava, as formigas exibiam suas formas arredondadas bem à brasileira e gingavam como se fossem exímias bailarinas, procurou a tanajura mentora do grupo, as duas se abraçaram, a formiga elogiava as vestes e o talento da cigarra chefe e essa retribuía os elogios olhando-a em trajes mínimos e insinuando sobre o seu avantajado traseiro, chamando-lhe a atenção para o número de formigões que deitavam-lhe olhares maliciosos e cheios de desejos eróticos. Riram abraçadas, mais tarde embriagadas comemoravam a nova fase das suas vidas.
Loracy

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Lia a Formiga e Ana a Cigarra





Texto de Simone



Lia Formiga e Ana Cigarra

Era uma vez uma menina baladeira, Ana Cigarra, que vivia em academias de ginástica e em festas, sem se preocupar com o futuro.

Um dia, no corredor do prédio, tropeçou com a menina estudiosa, Lia Formiga, e lhe disse:

- Porque você não esquece um pouco os estudos, larga esses óculos e vem aproveitar a vida.
- Porque a vida não é fácil e eu quero preparar meu pé de meia.

Anos se passaram e Lia Formiga entrou para faculdade, além de cursar aulas de inglês e espanhol. É claro que continuava a usar seus óculos de grau e acumulava um pouco de gordura localizada. Já Ana Cigarra se tornava mestre e doutora em novas modalidades de ginásticas, spas, clínicas de beleza e é claro, freqüentava festas e mais festas. Conhecia pessoas bacanas e endinheiradas.

Por mais uma obra do destino, as duas cruzaram-se novamente e, Ana Cigarra disse:

- Lia, porque você não vem se divertir um pouco. Deixe os livros de lado. A vida é curta e não aceita desaforos. Olha o anel que ganhei do Bruninho. Ele não resistiu a dança da cadela....e assim, vou construindo meu futuro.

- Prefiro não depender de ninguém e fazer o meu pé de meia. Afinal, dinheiro também não aceita desaforos.

Após algum tempo, a baladeira gostosona se casou com o filho do presidente de uma grande multinacional e curtia a vida como se não houvesse o amanhã. Festas, jóias, viagens, restaurantes caros, plásticas e lipos.

Já Lia Formiga se tornou uma grande cardiologista e casou-se com um jovem promissor, Zeca Pinto, futuro promotor de justiça.

Os anos se passaram e a meia idade não tardou a chegar.

Não é que Lia Formiga, bem sucedida no casamento e profissionalmente, e até que ajeitadinha, encontrou no salão de beleza de bairro com Ana Cigarra, gostosa e enxuta para tal idade e, surpresa perguntou:

- Ué, o que faz aqui neste salão? Pensei que só freqüentasse os do Jardins?
- Pois é, tô passando por algo inimaginável, um divórcio litigioso. Fui trocada por uma baladeira gostosa, tudo em cima, de 20 aninhos. Sai com um pé na frente e outro atrás. Tô sem grana, sem casa e sem amigos.

Lia Formiga que batalhou sua vida inteira ficou com tanta dor no coração, convenceu seu marido Zeca Pinto e convidou Ana Cigarra para ficar em sua casa enquanto os tempos de cólera passavam.

A baladeira então aceitou a ajuda com uma única condição. Queria retribuir o apoio com o único ensinamento adquirido em toda sua vida: aulas de ginástica, massagens e técnicas de relaxamento. Após algumas semanas, Ana Cigarra já reinava total como uma grande leoa na ex casa de Lia Formiga. Afinal, com tanto charme e dança da cadela o promotor de justiça, Zeca Pinto, deferiu a seu favor.


Moral da história: A beleza interior não impera no mundo soberano. Realmente, o mundo é dos espertos! Mantenha seu glúteo em pé que sempre haverá um pinto para te sustentar, afinal cabeça de homem pensa diferente de cabeça de mulher.

domingo, 22 de junho de 2008

A fantástica fábula desencantada



Texto de Ana Maria

Era uma vez dois irmãos Jacob e Wilhelm que viviam na Alemanha nos anos de 1730. Interessados por escrever contos de fadas, contos de encantamento e contos maravilhosos criaram mulheres encantadas perseguidas por madrastas malévolas com irmãs adotivas mimadas e incapazes. Em outro momento concebiam lindas princesas que de tão boas beijavam feras que se transformavam em lindos príncipes. Terminaram quase todas as fábulas com personagens viviam felizes para sempre. Até que um dia...

Surgiu a tal Chapeuzinho vermelho. Moça ou menina ninguém sabe ao certo. Nem tampouco se sabia da existência de mãe ou pai dessa personagem, será que era órfã a infeliz?. Para falar a verdade nem ao menos se conhece o verdadeiro autor dessa fábula torcemos por seja os Irmãos Grimm. Nesse conto não havia nenhuma fada
e nem havia nenhuma bruxa

Bem...Imagina-se que a mãe da mocinha era designer de moda e com esse conto lançou o capote com capuz que veio a ter estrondoso sucesso no mundo da moda até os dias de hoje com algumas variantes na cor.



Uns autores de causos e lendas criaram também um moleque negrinho brincalhão que usava capuz vermelho. Mas esse não era bom nem ruim, apenas arteiro.


Não percamos a nossa personagem de vista, essa pobre moça sem nome que não era princesa, nem bela, nem nada, apenas era boazinha e usava um capuz vermelho. Enfim uma personagem inútil, e o que escrever sobre ela? Teriam que inventar alguém que fizesse alguma coisa na história, pois nem a vovozinha da moça (única parente que se conhece mesmo após intensa investigação) faz algo na fábula, apenas passa o tempo todo na cama, puro ócio. Na verdade essa avó tinha sido uma vedete do teatro de revista carioca que não conseguiu nenhum papel importante e estava à porta da aposentadoria pelo INSS.



Sabia-se de fonte não fidedígna que a vó da moça era proprietária de uma elegante mansão na floresta, prêmio do jogo do bicho, onde há tempos recebia garotos de programa na calada da noite e depois da orgia nadavam pelados no lago existente atrás da casa. E para impedir a neta xereta de chegar lá de sopetão e pegar a velha no flagrante, dizia a vó para a pobre e idiota menina que a floresta era escura perigosa e cheia de feras. Mas imbuída de sua boa fé a mocinha atravessava a indolente floresta para levar os doces do Amor aos Pedaços para a vovozinha, e fazia isso todos os dias. Meu Deus, essa mulher deveria estar gorda como um cachaço! Ou prestes a morrer com altas taxas de açúcar no sangue...(Soubemos que há tempos não recebe mais os garotinhos de programa mas finge doença para receber os médicos do SUS)
Pelas investigações chegamos à conclusão de que a moça queria mesmo herdar a casa da velhinha.



Era tão determinada nessa maldade que enfrentou inúmeras vezes os animais da floresta sem nunca faltar a única visita. Uma vez deparou-se com um Lobo que todos chamam até hoje de Lobo Mau.Esse bicho seria o personagem que teria forte atuação no texto mas o roteiro mudou naquele instante. Ele era muito feio, feio pra caramba, mas tinha uma linda voz quando urrava elegante para ela, tinha corpo esbelto e peludo, a boca carnuda, os olhos flamejantes e as unhas de fazer inveja a qualquer mortal. A moça pensou: É hoje ou nunca mais. Se não me agarrar agora a esse coitado que pensa que é mau vou morrer solteirona e ingerida por um bicho papão. Comeram os docinhos da cesta, falaram da droga da vida, e amanheceram juntos na moita. Passou a chamá-lo de Lobão e assim tornou-se conhecido.

Agora faz sentido, a moça que não era encantada e nem encantadora só podia mesmo apaixonar-se por um animal sem pedigri que não se torna príncipe hora nenhuma nem depois do beijo.

E como era de se esperar, numa história dessas as personagens não podem acabar vivendo felizes para sempre... Não é mesmo?

Tenho pena dos Irmãos Grimm que tiveram que arranjar esse Lobo para a moça na ânsia de ajeitar a personagem. Talvez por essa história não merecer nenhum crédito é que eles não assinaram o texto quando o escreveram. Eu também não assinaria.

sexta-feira, 20 de junho de 2008

A cigarra e a formiga (uma paródia em tempos modernos)





Texto de Loracy Santana

A CIGARRA E A FORMIGA – (Uma paródia em tempos modernos)

A cigarra com garra e afinco, dedicava ao seu solitário canto. Ensaiava e sonhava com um futuro brilhante. Verão, época que lhe inspirava nas melodias, na poesia e em toda arte. O sol no campo brilhava, enquanto ela cantava e enchia de harmonia todo o matagal, os insetos felizes aplaudiam a generosa música, graciosamente ouviam. A cada dia que passava, ela mais bonita se tornava, com a longa saia transparente, os olhos grandes e buliçosos contemplavam toda a beleza da paisagem. Estudava o canto lírico e se inspirava no popular para a todos a gradar.

Rasteira e matreira a formiga trabalhava, acumulava fartura para época do inverno, já previa a cigarra pedindo-lhe ajuda, teria o prazer em humilhá-la e ensinar-lhe que a boa vida que levava, poderia ser breve, se acabava. Orientada por um grande tanajura, estudiosa dos grandes clássicos da economia mundial do século XIX, a chefe comandava um grande exército de trabalhadores, estabelecia turnos de doze horas, a ordem era trabalhar, produzir e acumular, muitas formigas tombavam exaustas; eram simplesmente retiradas do meio e atiradas ao relento, quem não aguentasse que morresse, ninguém tinha culpa da fragilidade de certas operárias.

A cigarra com o passar dos dias arrumou companhia, já não era solitária. Formou-se uma banda regida pela sua batuta, astuta a artista não dava na vista o seu talento para a arte, passou a ser contratada para apresentações em outras freguesias, sempre ao entardecer, pois a noite foi feita para o descanso. Não ganhava nenhuma fortuna, também nunca teve esse tipo de ambição, a sobrevivência e o aperfeiçoamento era suficiente para a realização dela e do grupo que a acompanhava, alegrava festas e casamentos, a fama corria solta, porém dinheiro nunca via, cantava pela alegria dos outros alegrar. A formiga no comando não aceitava desmando e esmerava na produção e as leis do capitalismo eram seguidas à risca, a grande mentora de Maquiavel era leitora, sabia como comandar.

Vésperas do inverno, seria o inferno para os insetos cantores e trabalhadores; em suas apresentações a cigarra e o seu bando sempre alguma coisa ganhava, precisavam sobreviver, que fosse ninharia, ela agradecia e mais alto e garbosa cantava. A formiga irritada comandava o operariado, a população aumentava e o que acumulava nunca era suficiente, precisavam mais e nas lavouras de soja do fazendeiro encontrou nas folhas macias um meio fácil de fazer sua colheita e dessa feita não foi feliz. O fazendeiro agoniado pelas pragas procurou recursos técnicos junto aos países importadores, as folhas envenenadas para o formigueiro levadas, tiveram o efeito da bomba atômica, a dizimação foi total e quando o inverno chegou tudo que tinham acumulado durante o verão apodreceu no fundo do formigueiro, o fungo sobrou, transformando em adubo e lucros para o fazendeiro.

A cigarra e sua banda voavam em uma excursão para um país vizinho e quando retornaram já era pleno inverno, escondidas parcamente do frio rigoroso, ensaiavam seus cantos tão baixinho que ninguém as escutavam. O inverno passaria certamente e novamente com o brilho do sol, voltaria a reinar alegria entre a banda que agora se transformara em orquestra. Estranhou não ver as formigas trabalharem. Era inverno, se lembrou a cigarra maestra, estavam as amigas certamente em seus abrigos a se fartarem de todo o fruto da exploração que durante o verão pela chefe fora estabelecida, mas afinal de contas cada um vive como pode.

CANÇÃO DO EXÍLIO (165 anos depois...)




Texto de Loracy Santana

CANÇÃO DO EXÍLIO (165 anos depois...)

Minha terra sem palmeiras,
Não canta mais sabiá;
Aqui não se ouve gorjeio,
Como outrora ouvia lá.

As estrelas continuam,
Nossas várzeas não tem flores,
Os nossos bosques sumiram,
Não tem vida nem amores.

Eu já não durmo direito,
Desde quando vim de lá;
Minha terra devastada,
Não canta mais sabiá.

Minha terra tem mazelas,
Assim como existe cá;
Antes das roças de cana,
Prazer eu encontrava lá;
A floresta se acabou
E não tem mais sabiá.

Tanto faz se aqui eu morra,
Ou que a morte seja lá;
Os campos de cana e soja
Que eu não encontro por cá;
A expansão do agronegócio,
Calou a voz do sabiá.

As tres porquinhas





Texto de Do Carmo

AS TRÊS PORQUINHAS.

UA PARÓDIA DA HISTÓRIA INFANTIL :

OS TRÊS PORQUINHOS E O LOBO MAU


No tempo em que os bichos falavam, Reis, Rainhas e Princesas moravam ao redor de florestas habitadas por Fadas e Bruxas. Com freqüência as Princesas e as Fadas encontravam-se nos passeios e conversavam com animação, o que deixava as Bruxas furiosas e mortas de inveja.
Uma delas, muito má, resolveu enfeitiçar três irmãs Princesas transformando-as em Porquinhas Cor de Rosa. Por mais que o Rei ordenasse e a Rainha em prantos rogasse, a Bruxa má não se comovia e as três Princesas permaneciam Porquinhas.
Um Rei vizinho soube do ocorrido, também vítima de bruxaria, foi visita-los para contar que se as Porquinhas beijassem seu filho, vítima, ele voltaria a ser homem e poderia salva-las devolvendo o beijo.
Com tão boa notícia, o Rei exultou de felicidade, mandou que preparassem os aposentos de hóspedes reais e marcaram para o final da semana a chegada dos Reis vizinhos.
O alvoroço no castelo era geral. Preparativos para banquetes e festas, decoração dos salões para bailes, mensageiros entregando convites nos reinos vizinhos, realmente os Reis transbordavam de esperanças.
Mas somente uma das meninas, a mais gordinha, estava confiante com a possibilidade de voltar ao normal. Suas irmãs, muito diferentes, diziam ser tudo bobagem e aceitavam a má sorte. A mais velha, pensava sempre em termos concretos, sem nenhuma fantasia; a do meio, muito racional, não encontrava uma solução lógica.
Finalmente chegou o tão esperado dia. A carruagem para em frente do castelo e um Dinossauro de ébano e marfim desce dirigindo-se em direção às Porquinhas, porém a impaciente gorduchinha adianta-se correndo. Ele se abaixa para cumprimentá-la mas, sem o menor pudor ela o beija lambendo-lhe os lábios entreabertos em um sorriso sensual. Uma nuvem de luz densa cai sobre eles. Logo ela se esvai e desse passe de mágica, surge um forte e lindo rapaz que envolve com ternura o corpo trêmulo da bela Princesinha.
Os pais felizes se abraçam e as mães, banhadas em lágrimas, correm a beijar e abençoar seus filhos, agora um romântico e apaixonado casal..
E as duas outras Porquinhas, o que foi feito delas ?
Bem, isso é uma outra história que fica para uma outra paródia.

O pai - Loracy Santana




Texto de Loracy Santana

O PAI (com cortes)

Clemente madornava. O Anjo apareceu, ele sentiu a presença do inefável e não fez nenhum movimento, ficou por um tempo suficiente para que fosse alertado dos males e benesses que estariam por vir. Chamou a esposa e pediu para falar com a filha. O clima era de paz, uma tranquilidade inacessível à compreensão humana. Helena, explicou ao marido moribundo sobre a impossibilidade de falar com a filha, ela fora à cidade comprar alguns remédios. Ele ficou desconsolado, fechou os olhos e pensou na aparição e nas suas palavras reveladoras, de tantos enigmáticos segredos há tanto tempo tão bem guardados.

Helena voltou à cozinha, onde preparava o almoço. Não era má, justa apenas; prática. Pensou nas modificações pelas quais o marido passara desde que se casaram. Poderia ter sido diferente, se com o outro tivesse se casado. Seu amor de adolescente, primeiro: rapaz da cidade, tão bem apanhado, rico e estudado. Não deu certo, o sofrimento apaziguado pela bondade de Clemente, moço do lugarejo, quase mato, um lugar atrasado. Ele. simples e comportado, temente a Deus, de religiosidade quase inocente. O moço precisava casar e constituir família; era esse o papel de todo homem. Depois que rompera o namoro, sentiu no abandono: grosseria e indiferença, o que pensava Clemente a seu respeito? Ele, que outrora a pedira em namoro, rejeitara, mas naquele momento nada melhor que aceitar o novo pedido e ter um moço tão decente como marido.

Sete meses de casados e o nascimento no momento não esperado por ele. Prematura e saudável criança, que durante a infância a todos encheu de alegria, até que um dia, Clemente revelou a promessa que fizera ao Padrinho. O Anjo Gabriel o batizara, por insistência da mãe o padre aceitara. Sendo Ele seu padrinho, tinha proteção e certas obrigações. A filha Inocência seria freira quando idade tivesse. Um choque para Helena, sua filha única, nascida de um complicado parto, tão complexo que lhe causara a esterilidade. Calada resolveu que a promessa do marido seria problema dele, não tinha o direito de direcionar o destino de Inocência, embora lhe tivesse obediência, filha tão apegada, deveria ter vida normal, ser um dia casada, com alguém de posses, capaz de mudar o futuro da família, pelo menos dela e da filha.

A igreja e a devoção; o afastamento distanciava o casal, relação sexual era para reproduzir, ele era fiel aos dogmas da religião. Helena levava a sério o distanciamento, mas aquele juramento estranho que mudaria o destino da filha, não aceitaria; tanto foi a insistência do marido que a sombra do ódio invadiu o seu íntimo, momento tenso e perigoso. A menina, mocinha agora, não via a hora do pai mudar de idéia, não tinha vocação para vida religiosa. Doía-lhe a desobediência. A mãe dissimulada, não falava nada, agia de acordo com a sua conveniência. Cuidava como sempre fizera do marido; prato feito na mão; da filha com desvelo e de um velho cachorro, com zelo, esse deu de dar trabalho, adoeceu, ela abreviou as coisas, fria e prática, vidro moído no alimento e o fim do sofrimento do animal. Restava para cuidar, marido e filha, ele doente a sofrer.

Deitado Clemente esperava pela filha. Helena não se aproximou do quarto, Inocência demoraria e muito. A cidade não era longe, mas teria de ir a vários lugares. Pobre homem! Certamente queria pedir algo importante para Inocência, um juramento talvez, uma promessa como atendimento de último pedido. Na volta para casa a moça pensava, se preciso fosse, se para a saúde do pai que definhava, parecia de desgosto, com doença talvez incurável, prometeria ir para o convento, para ele tão importante. O pai era bom e não merecia ser desobedecido. Naquele dia chegaria em casa muito tarde...

quarta-feira, 18 de junho de 2008

PAI, CHEFE DE FAMÍLIA OU UM REI ?




Texto da Do Carmo
Segundo o depoimento da filha caçula, que passo a narrar, fica para vocês, leitores, o julgamento final.

Nascida em uma família de classe média no final dos anos trinta, foi criada e educada tal qual uma boneca de porcelana, uma vez que seu nascimento deu-se dezoito anos depois do casamento dos pais.

Tudo que uma garota rica da época tinha, esse homem lhe dava - bens materiais e culturais.

Por amor à família, o pai estudou, cresceu como profissional, construiu um mundinho de conforto e amor para a mãe, que sempre colaborou costurando, e para as duas filhas.

Conta-nos ela com emoção, qual era a tônica predominante de seu comportamento : O bom humor.

Dentre as inúmeras histórias que contou, vou rapidamente transcrever duas :
1 ª - Muito glutão e apaixonado pela cozinha, uma de suas distrações caseira predileta era fazer. Doce, o preferido - Compota de abóbora - que era preparado com todo o requinte de higiene e cuidados. Casca bem lavada, retirada sem " machucar a carne " , cubinhos todos milimitrados , secos com uma toalha de cozinha própria, açúcar bem peneirado e.......vamos para a panela e para o fogão. Todo ritual obedecido, era só esperar o término do cozimento, que transformava os cubinhos em uma pasta bem cremosa e doçosa, como dizia, mas aí é que estava o problema, pois quando esse ponto chegava, a panela estava vazia, pois a cada minuto, lá estava ele de colher e pratinho na mão, pegando umas colheradas para ver o ponto. Iniciava o cozimento com mais ou menos três quilos, e depois de retirá-lo, havia evaporado uns dois quilos e meio. Nunca ele conseguiu explicar esse fenômeno.

2 ª - Gostava de tocar bandolim e cantar "cançonetas da velha terrinha " ao lado da máquina de costura da esposa, quando ele chegava do trabalho, e depois continuava, sentado na cozinha a seu lado, enquanto ela preparava o janta e aguardavam a chegada da filha mais velha, que trabalhava desde dezoito anos.

Sempre teve um comportamento muito alegre, disposto `qualquer trabalho, calmo no falar e diante de problemas, mas muito responsável com os compromissos e preocupado com o que deixar de material para a família quando se fosse, porque era muito rígido e intransigente com a educação e formação cultural das filhas, ambas formadas em curso superior, coisa rara na época em sua classe social.

Sua filha ao terminar o relato, questionou-me ; -

Como você classifica meu herói ?

O pai




Texto de Gabriela Araujo
Latidos, vizinhos de pijama na calçada e choros de criança. Dentro de casa o silêncio infinito e aliviado da mulher, a inquietação da filha e a indiferença do irmão sentados na mesa ao lado do corpo caído no chão.

Cresceu escutando as reclamações do pai. Primogênito logo aprendeu a responsabilidade da figura masculina. Atingiu idade suficiente ajudava o provedor no ofício. Todos os dias empilhava nas costas tudo que cabia. Sacos de cimento, pás e tijolos. O pai acompanhava reclamando. Suor, calos e exaustão. O pai reclamava.

Na casa, mulher e filha cumpriam a função feminina. Irmão trabalhava o pai reclamava.

A família era monossilábica. O pai reclamava, filho truculento, mãe misteriosa e a filha.
Cansativa, irritante, monótona, medíocre, miserável, irritante, sufocante, repetitiva, irritante, irritante, irritante rotina.

Aquela noite foi diferente. Chegaram, sentaram-se. A irmã abriu o portão, a mãe jogou a comida na mesa, o pai reclamou, o irmão comeu.O pai reclamava, a mãe, a filha, o irmão comia. Até que ele limpou a boca com a camiseta levantou e a enxadadas assassinou o pai.

O pai reclamou e ensangüentado caiu e permaneceu no chão, a mulher, a filha e o irmão voltou a comer.

A insignificante movimentação dentro daquele lar congelado foi suficiente para despertar a curiosidade dos outros. Latidos, vizinhos de pijama na calçada e choros de criança.

terça-feira, 17 de junho de 2008

A grande noite



Texto de Simone Rosenthal

A Grande noite.....

Tinham combinado de ir ao restaurante de sempre, mas desta vez, sem razões explícitas, resolveram pedir a tal garrafa de champagne como não faziam há anos. Depois de quase 3 horas de total cumplicidade, decidiram seguir o rumo de casa. Havia mais o que ser dividido...

Era aproximadamente meia noite, quando o casal do 32, que todos os dias aparentava a felicidade de happy ends dos filmes hollywoodianos, tomou o elevador.

Semi bêbados, com o resto da garrafa de champagne nas mãos, cambaleantes, risadas tenebrosamente altas, trocavam confidências ao pé do ouvido.

Entraram pela sala com uma fúria animal que logo foi se esvaindo....

Ela, com medo de perder aquele momento.... soltou:

- Você é tudo o que eu sempre procurei... quis fazer dessa noite a mais especial em tantos anos.... você será papai...

Ele a penetrou com um doce e, ao mesmo tempo, inquieto olhar. Ele a tomou nos braços até o banheiro e como sempre, encheu a jacuzzi, o aconchegante ninho de amor, e a temperou com o óleo apimentado. Suavemente, tirou a roupa dela.

Enquanto ele a deitava na água, soltou um suspiro ....

- Eu também queria que essa noite fosse especial, queria te jurar o meu amor eterno, e me embebedei para ter a coragem de te contar, sou estéreo.

domingo, 15 de junho de 2008

Maria do Carmo Giordano - Do Carmo para os amigos



http://semhoradocarmo.blogspot.com/
Olha o BLOG cor de rosa da Do Carmo! Acesse o blog e veja quanto brilhinho ela tem.

Ela é ativa toda vida!!! Vocês não podem nem imaginar do que essa mulher é capaz.
Vive de Oficina Cultural para outra atividade cultural. Tem um motorista particular, o Maurício que é um taxista que ela adotou para ir e vir.

É síndica do prédio onde mora e ainda arranja tempo para criar e mandar receitas culinárias para os amigos.

Ultimamente a Do Carmo tem tido uns repentes romanticos nos textos que ela cria.

Olha só a nossa amiga no Youtube numa entrevista para o www.museudapessoa.com.br



Pensa que é só isso?
Não é não, tem mais...




Esse vídeo aparece em comentário no site Terra: http://terratv.terra.com.br/templates/channelContents.aspx?channel=2489&play=true

A Do Carmo tem que nos contar se era ela essa vizinha da Violeta: http://txt.estado.com.br/suplementos/ali/2006/07/16/ali-1.93.19.20060716.49.1.xml


Tem sido um prazer textuar com você, Do Carmo!

Um beijo e um brilhinho

Marcelino Freire




Curso superior
Marcelino Freire


O meu medo é entrar na faculdade e tirar zero eu que nunca fui bom de matemática fraco no inglês eu que nunca gostei de química geografia e português o que é que eu faço agora hein mãe não sei.

O meu medo é o preconceito e o professor ficar me perguntando o tempo inteiro por que eu não passei por que eu não passei por que eu não passei por que fiquei olhando aquela loira gostosa o que é que eu faço se ela me der bola hein mãe não sei.

O meu medo é a loira gostosa ficar grávida e eu não sei como a senhora vai receber a loira gostosa lá em casa se a senhora disse um dia que eu devia olhar bem para a minha cara antes de chegar aqui com uma namorada hein mãe não sei.

O meu medo também é do pai da loira gostosa e da mãe da loira gostosa e do irmão da loira gostosa no dia em que a loira gostosa me apresentar para a família como o homem da sua vida será que é verdade será que isso é felicidade hein mãe não sei.

O meu medo é a situação piorar e eu não conseguir arranjar emprego nem de faxineiro nem de porteiro nem de ajudante de pedreiro e o pessoal dizer que o governo já fez o que pôde já pôde o que fez já deu a sua cota de participação hein mãe não sei.

O meu medo é que mesmo com diploma debaixo do braço andando por ai desiludido e desempregado o policial me olhe de cara feia e eu acabe fazendo uma burrice sei lá uma besteira será que vou ter direito a uma cela especial hein mãe não sei.


Marcelino Freire nasceu em 20 de março de 1967 na cidade de Sertânia, Sertão de Pernambuco. Vive em São Paulo desde 1991. É autor de EraOdito (Aforismos, 2ª edição, 2002), Angu de Sangue (Contos, 2000) e BaléRalé (Contos, 2003), todos publicados pela Ateliê Editorial. Em 2002, idealizou e editou a Coleção 5 Minutinhos, inaugurando com ela o selo eraOdito editOra. É um dos editores da PS:SP, revista de prosa lançada em maio de 2003, e um dos contistas em destaque nas antologias Geração 90 (2001) e Os Transgressores (2003), publicadas pela Boitempo Editorial. Visitem www.eraodito.blogspot.com e conheçam melhor o escritor e sua obra.


Texto extraído de seu novo livro "Contos Negreiros", Editora Record - Rio de Janeiro - 2005, pág. 97.


Entre nesses links e saiba mais, além de ouvir Marcelino Freire.



Museu da pessoa:

http://www.museudapessoa.net/literatura/podcast/ML23_Blog_e_literatura.mp3

Veja o Blog do Marcelino
http://www.eraodito.blogspot.com/

HORA DO RECREIO - Receita de biscoitinho de pimenta - aperitivo



Receita da Do Carmo que experimentamos e aprovamos:

Ingredientes:

200 ml de leite
200 ml de óleo
1 ovo inteiro
1 cebola grande ou duas médias
3 pimentas dedo de moça grandes (1 sem sementes no caso de menos picante )
3 colheres de sopa de margarina com sal
1 colher de chá de pimenta do reino branca
1 pitadinha de sal
200 grs. de queijo meia cura ralado grosseiramente
750 grs. de farinha de trigo (aproximadamente 5 xícaras de chá )
1 colher de sopa de fermento em pó.

Modo de preparo :

Exceto a farinha de trigo e o fermento em pó, bate-se todos os ingredientes, na ordem apresentada, em um liqüidificador.

Despeja-se em uma tigela grande e vai-se juntando a farinha de trigo, previamente peneirada com o fermente em pó, mexendo com uma colher apropriada, até que adquira consistência para sovar.

Em superfície enfarinhada, sova-se muito bem, até que a massa fique macia, homogênea e levemente oleosa, porém sem grudar nas mãos.

À esse ponto, começa-se a aquecer o forno.

Modelagem :

Os biscoitinhos são do formato de nhoques duplos, ou seja, torinhas grandes.

Cozimento :

Em forno quente, eles são assados até dourarem levemente e notar-se que estão cozidos, por volta de 40 minutos, variando do tipo do fogão.

Guarda-se em potes de vidro ou de plástico , quando totalmente frios

Intervalo de aula: Oswaldo Montenegro - METADE

Oswaldo Montenegro - Metade

sábado, 14 de junho de 2008

O pai

Texto de Loracy Santana


O Pai



Clemente madornava. O Anjo apareceu, ele sentiu a presença do inefável e não fez nenhum movimento, ficou por um tempo suficiente para que fosse alertado dos males e benesses que estariam por vir. Chamou a esposa e pediu para falar com a filha. O clima era de paz, uma tranquilidade inacessível à compreensão humana. Helena, explicou ao marido moribundo sobre a impossibilidade de falar com a filha, ela fora à cidade comprar alguns remédios. Ele ficou desconsolado, fechou os olhos e pensou na aparição e nas suas palavras reveladoras, de tantos enigmáticos segredos há tanto tempo tão bem guardados.

Helena voltou à cozinha, onde preparava o almoço. Não era má, justa apenas; prática. Pensou nas modificações pelas quais o marido passara desde que se casaram. Poderia ter sido diferente, se com o outro tivesse se casado. Seu amor de adolescente, primeiro, rapaz da cidade, tão bem apanhado, rico e estudado. Não deu certo, o sofrimento apaziguado pela bondade de Clemente, moço do lugarejo, quase mato, um lugar atrasado. Ele. simples e comportado, temente a Deus, de religiosidade quase inocente. O moço precisava casar e constituir família; era esse o papel de todo homem. Depois que rompera o namoro, sentiu o abandono, grosseria e indiferença, o que pensava Clemente a seu respeito? Ele, que outrora a pedira em namoro, rejeitara, mas naquele momento nada melhor do que aceitar o novo pedido e ter um moço tão decente como marido.

Sete meses de casados e o nascimento que no momento não era por ele esperado. Prematura e saudável criança, que durante a infância a todos encheu de alegria, até que um dia, Clemente revelou a promessa que fizera ao Padrinho. O Anjo Gabriel o batizara, por insistência da mãe o padre aceitara. Sendo Ele seu padrinho, tinha proteção e certas obrigações. A filha Inocência seria freira quando idade tivesse. Um choque para Helena, Era sua filha única, nascera de um complicado parto, tão complexo fora que lhe causara a esterilidade. Calada resolveu que a promessa do marido seria problema dele, não tinha o direito de direcionar o destino de Inocência, que embora lhe tivesse obediência, filha tão apegada, deveria ter vida normal, ser um dia casada, com alguém de posses, capaz de mudar o futuro da família, pelo menos dela e da filha.


A igreja e a devoção; o afastamento distanciava o casal, relação sexual era para reproduzir, ele era fiel aos dogmas da religião. Helena levava a sério o distanciamento, mas aquele juramento estranho que mudaria o destino da filha, não aceitaria; tanto foi a insistência do marido que a sombra do ódio invadiu o seu íntimo, momento tenso e perigoso. A menina, mocinha agora, não via a hora do pai mudar de idéia, não tinha vocação para vida religiosa. Doía-lhe a desobediência. A mãe dissimulada, não falava nada, agia de acordo com a sua conveniência. Cuidava como sempre fizera do marido, prato feito na mão, da filha com desvelo e de um velho cachorro, com zelo, esse deu de dar trabalho, adoeceu, ela abreviou as coisas, fria e prática, vidro moído no alimento e o fim do sofrimento do animal. Restava para cuidar, marido e filha, ele doente a sofrer.

Deitado Clemente esperava pela filha. Helena não se aproximou do quarto, Inocência demoraria e muito. A cidade não era longe, mas teria que ir a vários lugares. Pobre homem, certamente queria pedir algo importante para a filha, um juramento talvez, uma promessa como atendimento de último pedido. Na volta para casa a moça pensava, se preciso fosse, se para a saúde do pai que definhava, parecia de desgosto, com doença talvez incurável, prometeria ir para o convento, já que lhe era tão importante. O pai era bom e não merecia ser desobedecido. Naquele dia chegaria em casa muito tarde...


Era um sonho?

(Texto do último encontro, com os devidos cortes)



Texto da Do Carmo


ERA UM SONHO?



Hoje, exatamente hoje está completando treze dias que este mal estar começou.

Sempre que acordo, abro as janelas de meu apartamento. Nunca esse ritual incomodou-me como agora , pois lá está ele : o grande Dinossauro, meio de ébano e meio de marfim : olha-me, sorri mostrando-me seus dentes bem enfileirados e retorna a costumeira postura – sentado caprichosamente e com negligência repousa seu vigoroso corpo e lá fica até que outra vez eu abra as janelas ,para um novo dia.

Mesmo com toda a azáfama do dia a dia, meu cérebro não tem conseguido se desligar da persistente angustia causada por essa visão, que não sei dizer com segurança, se é real ou apenas fruto de minha imaginação, pois meus pensamentos são arrojados para o meu modo de ser. Mas tenho certeza que me sinto muito desconfortável com essa sensação.

Mas hoje, exatamente hoje, décimo terceiro dia, acordo com o toque da campainha do interfone......, não, é do telefone....., mas que turbilhão de sentimentos, não consigo identificar o que me transtorna, ou melhor, não quero pensar que possa ser um sonho.

Não sei se estou dormindo ou acordada, mas a emoção do momento faz-me abandonar-me totalmente naqueles braços fortes e voluptuosos. É o meu Dinossauro de ébano e marfim que me domina.
Sinto uma vertigem, tudo gira ao redor, porém lentamente me acalma e diz com um lindo sorriso, voz firme e envolvente :

- O seu Dinossauro de ébano e marfim está aqui.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Caso de encantamento (com os devidos cortes)




Texto de Loracy Santana

CASO DE ENCANTAMENTO (com os devidos cortes)


Eu ando pelo mundo, matutando vejo e vivo coisas; que talvez você distante dessas brenhas nunca tenha imaginado existir. Meu mundo. Os segredos nesse degredo, são grandes e perigosos. O homem desses cerrados, que aqui é criado, carece de proteção, de corpo fechado, pra se conseguir, faz coisa que amarra e segura a gente em um mundo de escuridão, o sujeito fica endividado, que nem eu que devo a Deus e ao diabo, e que agora fico aperreado; chega a velhice e nunca se sabe quem vai cobrar primeiro. Fiz coisa seu moço, que é segredo meu, mais que me queima por dentro, quando a gente é novo brinca muito, mais depois...


O velho Lobato era assim, mais pra calado do que de muita de fala. A cabana no meio do cerrado: ele e Maria Capenga, sua mãe, que de velha perdera a conta. Sete filhos nasceram dela que nunca diz se amou a todos como ama Lobato, único a não lhe ser ingrato, fiel como cão, os outros se foram pelo mundo, abandonaram o sertão, com sua rudeza e doçura. A mulher não fez outra coisa na vida a não ser rezar e pedir proteção para o filho. Sétimo filho homem, não virou padre. Só por milagre não ia se virar em lobisomem, é a lei do mundo, o destino precisa se cumprir, sempre fora assim.


Maria Capenga não pensava em futuro pra ela, sabia que um dia se encantaria; não iria sofrer depois de morta em céu nem inferno, ia ficar encantada, sabia disso. Se arrastava pelo meio do cerrado, catando frutas do mato, o filho ajudava, nas horas que se arredava da roça. Desse pra conversar com o filho, falaria pra ele dos seus medos, mas era começar e ele se arreliava, dizia que de sua vida cuidava ele. Quando vinha notícia de bicho que atacava ninhadas de cachorro ou de gato, ela sobressaltava, e rezava, se coisa ruim acontecessesse era culpa dela, pra que ter tanto filho e tudo homem? Ainda por cima ter se enviuvado, nem pra viver e lhe ajudar, nem pra isso o marido prestou, mas que Deus guardasse um lugar pra alma dele, dos mortos mal não se deve falar.


A sina. Era só no nisso que Lobato pensava, no destino e no pacto que fizera. Precisou fazer aquilo, precisava do corpo fechado. Perigo maior estava em bala benta e faca virgem. O diabo protegia, mas não se manifestava, o que será que iria querer além de sua alma? A mãe rezava muito e talvez por isso ele vivia de difícil aparecer. Lobato precisava saber de alguma coisa, se achava velho e cansado. Sexta-feira de lua cheia, precisava sair, esperava a mãe dormir, ela deitava e na esteira logo roncava. O mesmo caminho, a roupa tirada e deixada pelo avesso e a missão protegida, tinha certeza da proteção, foi trato feito de boca, mas o coisa ruim não brinca em serviço.


Na cumeeira da cabana uma enorme coruja agourava. Era a mãe que ontem mesmo todo mundo viu espichada na mesa e dentro da rede jogada na cova cavada por poucos braços. Estava lá, voou para o galho da paineira, o canto ecoou pelas grotas. Canto sinistro, como gargalhada sem sentido. A mãe cumprira o prometido, se encantou e podia agora ser livre no sertão, e ele? O encontro estava marcado, na mesma encruzilhada de tantos anos atrás, o encontro tiraria todas as suas dúvidas. Prometera a alma para o demo, mas nada perguntou para ele: Tinha muita coisa que precisava saber, esperava ansioso a noite chegar. Não era sexta-feira, portanto não tinha nada de importante a fazer, aguardou a noite cair, sem lua. Erma, de breu.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Faça-me vento!

12 de junho é dia dos namorados!







Faça-me vento!


Era o vento que brincava de espalhar seus cabelos no momento em que nossas bocas se beijavam na praia.

Era de novo o vento que, deliciosamente, balançava sua blusa branca mostrando de leve suas formas sob ela, me provocando.

E outra vez o vento sacudia sua saia tornando-a menina divertida diante do incontrolável.

Deslumbrado, até do vento tenho ciúme. Ele que te toca de maneira assintosa, te alegra, te refresca, se insinua. Queria ter o poder do vento para rodopiar no seu corpo e faze-la rir diante do meu deslumbramento. Jogar com seus cabelos, espalha-los, desnorteá-los. Bulir com suas roupas e invadir o que elas escondem.

E depois sair ileso tendo produzido em você emoções e sensações repentinas e incontroláveis.

Olhar fatal (com cortes)

(A Bia me escreveu dizendo que ainda falaria comigo sobre possíveis cortes no texto Olhar Fatal. Antes, passei a tesoura!)


Texto de Ana Maria Maruggi


Olhar fatal ( com cortes)


Era um sábado à tardinha quando num bar a família Lima reuniu-se numa mesa para comemorar o aniversário do menor. À porta surgiu Miro Silva com panca de galã e engolindo a mãe com olhos de vaqueiro. Ela desandou a ajeitar o cabelo da mais velha e fez o que pode para desatinar de pensamento ruim.

Miro caminhou atrevido em direção à mesa da família e pediu fósforo. A mãe enfiou a mão na bolsa magra e de lá saiu com olhos culpados em direção ao rapaz.

O chefe da família percebeu a ousadia do moço e levantou-se devagar. Miro ali permaneceu mais alguns segundos e ainda ensaiou perguntar quem fazia aniversário. O pai puxou o rapaz pelo colarinho encarando o moço com ódio. Miro riu abusado da ameaça do homem e não se moveu. A ofensa cresceu para o rei daquela família que a tudo assistia. Ele então puxou a peixeira da cinta e num gesto rápido e forte golpeou o rapaz na barriga. Miro arqueou derrubando a mesa do bolo, mas ainda mantinha o riso sarcástico nos lábios. O chefe da família suava frio tremendo até os ossos quando Miro sacou a garrucha e disparou dois tiros certeiros na cabeça do rei Lima.

Um grito de mulher tomou conta do ambiente, e depois o silêncio.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Olhar fatal

Texto de Ana Maria Maruggi

Olhar fatal

Era um sábado à tardinha quando no bar a família Lima reuniu-se numa pequena mesa para comemorar o aniversário do menor. O do meio estava encantado com a janta fora de casa. A mais velha usava a melhor roupa que imaginava combinar com o baton barato. O bolo Pullmann trazido na bolsa de mãe estava arrumado num prato de louça com as beiras quebradas e a tubaína já podia ser servida aos pequenos.


À porta surgiu Miro Silva com panca de famoso estancando com pose de galã e engolindo a mãe com olhos de vaqueiro. Ela desandou a ajeitar o cabelo da mais velha e fez o que pode para desatinar de pensamento ruim.


Miro caminhou atrevido em direção à mesa da família e pediu emprestado o fósforo. A mãe enfiou a mão na bolsa magra e de lá saiu com olhos culpados em direção ao rapaz.


O chefe da família percebeu a ousadia do moço e levantou-se devagar. Para um homem de bem isso já seria o bastante para fazer com que o safado se afugentasse.


Mas não foi para Miro que ali permaneceu mais alguns segundos e ainda ensaiou perguntar quem fazia aniversário. O pai de punhos cerrados puxou o rapaz pelo camisa encarando o moço com ódio e disse que na família não cabia mais ninguém e recomendou que ele sumisse dali enquanto estava vivo para isso. Mas Miro riu abusado da ameaça do homem e nem se moveu. A ofensa cresceu para o rei daquela família que assustada a tudo assistia encolhida no canto sob o balcão de bebida. O pai puxou a peixeira da cinta e num golpe rápido e forte golpeou o rapaz na barriga. O sangue do rapaz correu ligeiro para fora da roupa. Miro arqueou derrubando a mesa do bolo, mas ainda mantinha o riso sarcástico nos lábios. O chefe da família suava frio tremendo até os ossos pasmou diante do fato. De repente Miro sacou a garrucha e disparou dois tiros certeiros no peito do rei Lima.


Um grito de mulher tomou conta do ambiente, e depois o silêncio.

Pela janela do quarto


Texto de Wanda Del Rigo
Pela janela do quarto
Pela janela do quarto olhando ao redor, deparo com o mundo lá fora: Perdizes, Sumaré, Pompéia, Lapa, Pico do Jaraguá, numa profusão de prédios, torres e antenas, mil janelas abertas, em cad auma delas quanta alegria, quanta tristeza, sonhos e esperança.
Pela janela do quarto me encanto com a presença da PUC, com alunos que entram, que saem, com seus manifestos, protestos, e suas algazarras noturnas. Lembranças da PUC invadida, bombas explodidas, alunos humilhados, revoltados assustados, com os corações apertados.

Pela janela do quarto vejo a imensidão da noite com suas estrelas brilhantes alentando corações.

Nunca antes havia visto através da janela do quarto o que hoje vejo com espanto...

UMA MÚSICA ... ... UM SONHO ...


Texto de Do Carmo


Foi uma verdadeira HISTÓRIA DE AMOR. Sonhos podem ser materializados e romanticamente vividos, tudo depende da intensidade com que se sonha.


Não foi diferente com aquela mocinha sonhadora que no mês de julho do longínquo, mas tão presente ano de 1955, inicia à realização de seu SONHO DE AMOR. Quem é ela? Que sonho de amor acalentava? Aconteceu realmente ou não passou de mais uma história vivida em romances " melosos ", tão em moda nessa época de glamorosas paixões e romantismo?


Sim, foi real e vivido. Não do modo como foi sonhado, onde um Príncipe Encantado, " Sheique Árabe de olhos cor de mel ", chega cavalgando em um alazão preto e arrebatando-a nos braços a leva para seu palácio em pleno Saara, onde viverão um romance como os contados nas histórias das " MIL E UMA NOITES ".


Bem, passemos á história real dessa garota de dezesseis anos de idade, que estava passando as férias de meio de ano ( ela cursava o primeiro ano do curso Normal, hoje Magistério ) na casa da família de uma amiga de sua irmã, no Rio de Janeiro.


A garota sonhadora, que ainda continua romântica aos sessenta e oito anos, é a Docarmo, conhecem?


É, foi comigo que tudo aconteceu. Um sonho que perdurou até l972, quando foi irremediavelmente interrompido pela morte.


Era l955, a segunda vez que passávamos férias no Rio. Haviam dois motivos importantes para tal repetição, além da saudade dos amigos : - por ter o Rio um inverno bem mais quente do que o úmido e cinzento de São Paulo e por ficarmos mais soltas, sem a acirrada vigilância de dona Rosa, mamãe, mesmo sendo dona Filó, ( a mãe da amiga, Dina ), também uma " generala ", mas com ela era mais fácil driblar quanto aos horários; contávamos ainda, com seu Athaliba, o pai, que era bem mais maleável, até nos defendia das rabugices de dona Filó.


A casa ficava na Gávea, dentro do Jóquei Clube, onde seu Athaliba trabalhava como Administrador. Como era movimentado nosso dia! Pela manhã, logo depois do café que já tomávamos prontinhas para sair, íamos a uma pracinha ao lado da casa com bancos, levando livros para serem lidos os quais nunca foram folheados além do índice, e flertávamos com os rapazes e eram muitos, que trabalhavam lá ou iam treinar equitação. Divertíamo-nos muito. Depois do almoço tínhamos algumas tarefas domésticas determinadas por dona Filó e mais tarde, por volta de quinze horas, saíamos para passeios pela praia e encerrávamos o dia em alguma confeitaria onde lanchávamos. Depois, só casa nada mais de rua.


Numa sexta feira notamos um alvoroço incomum. Havia chegado uma turma de mais ou menos dez estudantes de Veterinária, em visita ao Jóquei. Para recepcioná-los foi oferecido um almoço no sábado ( para nossa alegria ), seu Athaliba e família estavam incluídos no rol dos convidados.
Dia esplendoroso, céu azul, sol brilhante, música, flores e gente elegante e bonita desfilando pelos jardins que mais parecia o Éden. Eu lá, deslumbrada com toda aquela beleza. Sem perceber, comecei a sonhar.


Tudo transcorreu em ritmo de maravilha. À tardinha um conjunto musical iniciou um shou, onde todos acompanharam cantando e dançando. Em um determinado momento o solista do conjunto solicitou nomes de músicas aos convidados. Sou tímida, atualmente supero, mas naquela época não ousei falar em tom alto que gostaria de ouvir alguma música do cantor Dick Farney, o grande ídolo do meu coração. Não lembro bem como foi, mas devo ter falado alguma coisa que identificasse meu desejo, mas baixinho e naturalmente não foi ouvido. Flertei e dancei bastante com vários alunos, não me interessando particularmente em nenhum, era tudo festa, glamur e alegria. A festa encerrou-se às vinte horas com um breve discurso de agradecimento por parte do dirigente convidado - eram da USP da Escola de Veterinária -, promessas de retorno próximo, etc., etc. e fim. Tudo voltou ao normal


Depois de tanta agitação, só nos restou os comentários que se alongaram até bem tarde, na concepção da época. Por volta de onze horas todos na cama.


Dormíamos. Silêncio absoluto. Eis que de repente, uns violões e uma voz bem desafinada, diga-se de passagem, despertam toda a casa e a vizinhança.


Cinco rapazes tocavam e um cantava músicas de Dick Farney - Um cantinho e você, Não tem solução, Uma loura e Sábado em Copacabana - a minha.


Meu coração estava para sair pela boca, quem eram eles, o por quê de Dick Farney, como sabiam da minha preferência, seria mesmo para mim, não eram as músicas o importante e sim o contexto, o cantor que eu amava. Quando as janelas já estavam abertas e nós debruçados para ver quem estava provocando todo aquele alarido, uma voz destacou-se gritando :


- Menina, qual o seu nome, eu posso amanhã conversar com você?


Dona Filó adiantando-se, respondeu


`- Amanhã é segunda feira, agora já é domingo e nós queremos dormir. A menina é menina e não está em idade de namoricos, vão embora.


- Por favor senhora, estou apaixonado pela sua caçulinha, deixe que eu .....


Seu Athaliba intervém para terminar com aquele constrangimento no meio da noite e permite que pela manhã, às onze horas, ele volte ali mesmo, mas sem cantorias, que estaremos esperando por ele, na janela da sala, por ser no piso térreo onde todos estarão mais confortáveis. Ele agradece, diz que seu nome é Antônio com acento, todos se retiram e ele canta -

Mas vou voltar, para a semanaaa........

Cinco anos depois, diante de um altar transbordando de luzes e flores, dizíamos SIM e tornávamos marido e mulher. Esse sonho foi vivido até que a morte nos separou, depois de dezessete anos de feliz e apaixonada convivência. Hoje tenho duas testemunhas vivas desse romance, as quais se multiplicaram dando-me três maravilhosos netos que amo incondicional e intensamente. Sou feliz e bem resolvida em meus anseios e objetivos e sinto-me muito orgulhosa com as realizações vitoriosas de meus filhos.


Recordar é viver, diz o refrão popular, então eu acabo de VIVER AS EMOÇÓES DA HISTÓRIA DO GRANDE AMOR DE MINHA VIDA.